Review presente na edição nº39 (Orson Welles) da
Como em muitos outros dos seus
filmes, Orson Welles realizou, produziu, escreveu e protagonizou The Lady From Shanghai, adaptado do
livro de Sherwood King “If I Die Before I Wake” é um dos film-noir mais
aclamados de sempre. De uma imaginação inigualável em termos de realização e
complexidade no que toca ao enredo, este é uma daquelas obras que permanecerão
para sempre intemporais pelo seu absoluto fascínio.
Michael O’Hara (Orson Welles), um
marinheiro Irlandês (Welles faz um sotaque um tanto ou quanto irritante, sendo
sem dúvida essa a coisa que mais me incomodou durante filme) é quem nos narra
os acontecimentos da história desde o primeiro minuto. Uma noite conhece a
belíssima Elsa Bannister (Rita Hayworth, absolutamente deslumbrante como
qualquer feme fatale deve ser) e de imediato se apaixona por ela. O’Hara
salva-a de um bando de assaltantes e pelo caminho de regresso a casa deixa-se
imediatamente levar pelos seus encantos, mas recusa uma oferta de emprego no iate
do seu marido Arthur Bannister (Everett Sloane) um famoso advogado criminal na
cidade de São Francisco. Totalmente enfeitiçado pelo charme arrebatador de Elsa
– “from that moment on I did not used my head very much except to be thinking
for her” – era então tarde demais para fugir à tentação. O’Hara estaria longe
de imaginar de que poderia chegar ao fim da viagem de iate como acusado de um
assassinato que não cometeu. George Grisby (Glen Anders), personagem secundário
mas bastante emblemático na história pela performance paranóica e por vezes até
pertubadora, revela-se uma peça chave na resolução da mesma. Braço direito de
Mr. Bannister observa, intimida e é o responsável por perturbar e distorcer a
mente e intenções de O’Hara. Sabemos que os quatro são de algum modo pessoas
ambiciosas, só não sabemos se terão realmente o egoísmo e más intenções que por
vezes transparecem pelas entrelinhas de um misterioso puzzle.
A história não tem muito a ver
com Xangai a não ser o facto de Elsa ter passado algum tempo lá quando era
criança e ter aprendido a língua, conexão com o título que só fazemos bem perto
do final. A viagem de iate desde Nova Iorque, passando pelas Caraíbas, até
Acapulco é algo digno de uma cinematografia deslumbrante e é engraçado vermos o
contraste entre os ambientes de cada área e a atitude fria e preocupada dos
personagens. As fascinantes composições visuais, o uso das luzes, sombras e o
brilhante trabalho de camera, com ângulos vertiginosos ou maravilhosos
close-ups faciais, complementam esta história de luxúria e traição mas com todo
o charme que é requerido pelo estilo noir. Ele carrega consigo a visão negra de
um mundo caótico cheio de manipulação, segundas intenções e a atmosfera sombria
de um pesadelo que nos absorve de forma inquietante e energética.
Em 1948 quando o filme sai, revela-se
um pouco incompreendida. Por detrás daquilo que parece ser um filme bastante
simples, Welles acaba por fazer com que queiramos desvendar todos os pequenos
detalhes simbólicos de cada situação tentando perceber a sua lógica e até mesmo
nas situações que possam parecer mais disparatadas, existe uma progressão
naquilo que Welles pretende passar ao espectador. Todas as personagens vivem
algum tipo de pesadelo e a tensão constante entre elas traduz-se em momentos de
atmosfera pesada mas absolutamente intensa guiando-nos até um final sinistro
mas literalmente único.
Apesar de ter sido muito aclamado na Europa, The Lady From Shanghai só obtém reconhecimento nos Estados Unidos décadas depois, sendo nos dias de hoje considerado um dos grandes clássicos noir.
Classificação final: 4 estrelas em 5.
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