sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Crítica: Detroit . 2017


Ninguém pode negar que Kathryn Bigelow sabe o que é criar tensão num filme! Detroit é a mancha agonizante do pesadelo que é a agressividade policial americana perante a comunidade afro-americana que ecoa nas suas raízes históricas. Com muito poder emocional, este é um retrato de exclusão social e controlo por partes das autoridades.

O filme é todo ele suportado por um lado fortemente documental, nomeadamente na sua introdução que vai inserindo as personagens no contexto histórico, uma época onde reinava a discórdia entre policias e negros, que lutavam pelos seus direitos sociais e civis por toda a cidade de Detroit, até chegar ao episódio onde se centra o verdadeiro conteúdo moral desta história e daquilo que foram os eventos reais passados no Algiers Motel em 1967, , algo que acabaria por resultar na morte de três jovens negros e no sequestro e espancamento de outras nove pessoas. Alertados por um alegado tiroteio, depois de revistar o motel e verificar que um suposto sniper não se encontrava no local, um grupo de indivíduos das forças policiais, resolve submeter um grupo de jovens a um jogo mental aterrorizante, consequência do racismo e abuso de poder por parte de representantes da lei.


Estamos perante uma experiência intensa e enervante, e que Bigelow é capaz de dirigir muito bem, em cenas com planos fechados ou movimentos bruscos que criam um ambiente de claustrofobia, fazendo sentir as emoções à flor da pele. A introdução pode parecer um pouco longa demais, com momentos que parecem ser apenas repetição de outros filmes do géneros, com os clichés do género, mas acaba por se revelar essencial para o que se está prestes a assistir. A um ritmo mais lento vamos chegando a espectáculo de horror e humilhação que revolta qualquer um que não esteja de acordo com atitudes racistas e de extrema violência. Se percebemos que a forte presença e o carisma de John Boyega o iriam levar longe em Star Wars Episode VII, aqui ficamos de queixo caído. Ele, como muitos outros personagens dos filmes de Bigelow, é o bom profissional, comprometido a cem por cento com o seu trabalho, neste caso condenado a ver a sua raça subjugada à supremacia branca da qual não quer participar, mas se vê obrigado a aceitar. Enquanto a performance de Boyega causa compaixão por razões óbvias, a de William Poulter tem o efeito oposto sendo aterradora e de uma frieza profunda, que repugna até por simples expressão corporal. O cast é quase todo composto por caras novas, mas é surpreendentemente bom.

Para além do contraste racial, era inevitável não fazer a ligação politica e judicial da coisa, algo que até poderiamos ter passado sem, pois obtemos um terceiro acto apressado, com momentos pouco esclarecedores dentro da timeline, mas é dada a devida importância aos sobreviventes demonstrando que são episódios como estes que ecoam na História e continuam a ter peso, sobretudo quando se enquadram numa era americana em que forças policiais continuam a abusar de vidas inocentes apenas pela cor da sua pele. 

Detroit ganha magnitude pela experiência cinematográfica que proporciona, pelo lado emocional e humano que faz passar ao demonstrar as coisas reais que por vezes a humanidade gostaria de negar. Não é perfeito, mas é mais um retrato significativo e bem conseguido na sua maioria. Kathryn Bigelow volta a satisfazer-me tal como tinha feito em The Hurt Locker e deixa para trás a trapalhice de aborrecimento que foi Zero Dark Thirty.

Classificação final: 4 estrelas em 5.
Data de Estreia: 14.09.2017

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